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quinta-feira, 1 de março de 2012

Olhos de gata à meia-noite...



A gata desfila pela casa como uma rainha. Senta-se, observa e nada escapa a sua atenção. Senta-se num chão que carrega em si marcas de dias iguais, marcas perceptíveis na sujeira que não se dá mais ao trabalho de esconder-se sob o tapete e fica a vista de todos, inclusive da própria gata.

O mesmo chão pisado por pés sem rumo, que seguem apressadamente para lugar algum, que vagam pela casa, que vagam pelo olhar da felina que, religiosamente, senta-se disposta a cumprir sua tarefa. Tudo observa a gata e ela tudo observa de volta.

Perto das 7h ela dorme no quarto quente e passeia um passeio sonâmbulo quando pensam que ela acordou. Ventilador, televisão, parede, mala e chão: tudo na casa pensa enquanto humanos dormem.

Quando metade do dia se vai a gata vai também. Vai pro lado, pra encenarem a limpeza do chão. E a felina cumpre seu papel com maestria, sendo ela a única que não precisa fazer-se atriz. Ela incorpora seu papel e vai pro lado.

Mas sempre, sempre perto das 22h, a gata pára feito estátua, senta-se e observa. Observa com olhos cansados de ver, dia após dia, a mesma coisa vaga e vazia impressa na rotina de encenação que ela se põe a observar. E a participar.

Perto das 23h ela busca nos lados alguma resposta minimamente convincente pra inércia que invade todos aqueles que observa. Não encontra nada. Os objetos e móveis da casa sussurram hipóteses erradas na esperança de, um dia, desvendar tal enigma. Mas não há razão para pressa. Amanhã a gata tudo fará novamente e todos terão outra oportunidade para errar.

Agora a gata deita-se. Vai restabelecer-se pois precisa desfilar feito rainha amanhã e a casa é grande, o esforço é grande... E então chega a hora de não tirar os olhos de mim e o relógio soa meia-noite.

2 comentários:

  1. I gato, para mim, sempre foi sinal de beleza e mistério, mas você me mostrou mais uma face desse lindo animal: a realeza. Eu já tinha notado que são animais orgulhosos e espertos, mas não havia ligado isso à nobreza. Gostei muito da poesia de seu post.

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  2. Só tive um único gato em minha vida, e este era o próprio inferno. Não deixava de ter algo como a realeza, e seu texto me fez lembrar dele, comparando-o a um príncipe ingrato, aquele gato era mesmo O chato da casa. Arranhava todo mundo, mal podíamos andar perto dele. Mas enfim, nem ele me tirou a admiração por gatos, eles são místicos, e isso fascina que só, gosto principalmente da deusa-gata Bastet e da forma que eram associados as bruxas, o jeitinho que eles são descritos nos livros House of Night, também, amo. rs Terei mais gatos, apesar de minha experiência rs, podem até não ser tão afetuosos, mas são mais ESPIRITUOSOS e únicos que cachorro *-* ótimo texto, como sempre (:
    ~
    Eu queria deixar aqui um agradecimento especial por gostar do meu blog e voltar sempre lá. Seus comentário me movem. São mais do que alguém que 'passa', e eu amo isso. É uma espécie de reconhecimento, um impulso para eu melhorar e escrever mais. Eu tenho POUQUÍSSIMOS como você, e valeu mesmo. Saiba também que era para esta espécie de agradecimento particular estar no nosso último post, a comemoração dos 100, mas a Li não gostou da ideia kk

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